sábado, 21 de fevereiro de 2015

Drone varrerá Amazônia em busca de civilizações antigas

 

Mais de 450 geoglifos foram identificados em áreas de desmatamento na Amazônia
Cientistas britânicos vão usar um drone para fazer varreduras na Amazônia brasileira e procurar vestígios de civilizações antigas.
O avião não-tripulado que será enviado para a região é equipado com um laser que analisa e procura por áreas onde podem ter existido construções há milhares de anos.
O objetivo do projeto é determinar qual era o tamanho destas comunidades milenares e até que ponto elas alteraram a paisagem local.
Os pesquisadores anunciaram a iniciativa durante a reunião anual da Associação Americana para o Progresso da Ciência (AAAS, na sigla em inglês), na cidade de San Jose, na Califórnia.
O projeto, uma parceria entre agências e instituições do Brasil e Europa, já conseguiu uma verba de US$ 1,9 milhão (cerca de R$ 5,3 milhões) do Conselho Europeu de Pesquisa.
Dependendo dos dados obtidos, eles também podem ser usados para a elaboração de políticas de uso sustentável da floresta.
Mas a questão mais importante é tentar compreender a escala e as atividades das populações que viveram na Amazônia no final do período antes da chegada dos europeus à América, ou seja, os últimos 3 mil anos antes de 1490.
Padrões no solo
A equipe internacional vai tentar encontrar na Amazônia os chamados geoglifos, que são desenhos geométricos grandes feitos no chão.
O drone usado no projeto carrega um instrumento a laser que pode examinar áreas que não foram desmatadas
Mais de 450 destes geoglifos, em vários formatos geométricos, foram encontrados em locais onde ocorreu desmatamento.
Mas até hoje ninguém sabe exatamente o que estes círculos, quadrados e linhas representam – há indícios de que fossem centros cerimoniais.
No entanto, o que se sabe é que eles são provas de um comportamento coletivo.
“É um debate acalorado agora na arqueologia do Novo Mundo”, afirmou José Iriarte, da Universidade de Exeter, na Grã-Bretanha.
“Enquanto alguns pesquisadores acreditam que a Amazônia foi habitada por pequenos grupos de caçadores-coletores ou então por pequenos grupos de cultivavam apenas para a subsistência, que tiveram um impacto mínimo no meio ambiente, e que a floresta que vemos hoje foi intocada por milhares de anos, há cada vez mais provas mostrando que este pode não ser o caso.”
“Estas provas sugerem que a Amazônia pode ter sido habitada por sociedades grandes, numerosas, complexas e hierárquicas que tiveram um grande impacto no meio ambiente; o que nos chamamos de ‘hipótese do parque cultural’”, disse o cientista à BBC.
Drone e satélite
O projeto de Iriarte prevê o sobrevoo do drone por algumas áreas da floresta que servirão de amostra.
O laser acoplado ao drone vai procurar geoglifos estão escondidos em regiões ainda não desmatadas.
Parte da luz deste laser, chamado de “lidar” (“light-activated radar”, ou radar ativado pela luz, em tradução livre) consegue ultrapassar a barreira das folhas das árvores.
Serão feitas várias inspeções e, se a existência dos geoglifos for confirmada, os cientistas vão tentar determinar mudanças específicas que foram deixadas no solo e na vegetação pelos antigos habitantes.
Estas “impressões digitais” poderão ser buscadas por imagens de satélites, possibilitando uma busca em uma área muito maior da Amazônia, maior do que com o pequeno drone.
Em imagens aéreas normais, apenas os topos das árvores são visíveis
O instrumento a laser do drone faz o mapa digital da vegetação destes topos de árvores
Este mapa pode então ser removido e deixar apenas o sinal do laser que conseguiu ultrapassar a vegetação e chegar ao chão
E, a partir deste projeto será possível avaliar como a Amazônia pode ser gerenciada de forma sustentável. Segundo Iriarte, não é possível especular quais seriam as mudanças futuras aceitáveis na Amazônia se não existir uma compreensão completa de como a floresta foi alterada no passado.
“Queremos ver qual é a pegada humana na floresta e então formar uma política (de uso), pois pode ser o caso de que a biodiversidade que queremos preservar seja o resultado de uma manipulação no passado desta floresta”, explicou.
Por: Jonathan Amos
Fonte: BBC Brasil

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Alertas de desmatamento continuam em alta

       
        Imazon faz o monitoramento independente do desmatamento na Amazônia Legal e divulgou, nesta quinta-feira (12/02), o balanço dos alertas para janeiro de 2015. Os números continuam ruins para a floresta.
        Em janeiro foram detectados 288 Km² de perda florestal, contra 109 km² registrados em janeiro de 2014: um crescimento de 169%. Este é o sexto aumento consecutivo na taxa, que vem apresentado tendência de alta desde agosto, o primeiro mês do ano-calendário de medição do desmatamento na Amazônia Legal. O calendário vai de agosto até julho do ano seguinte – neste caso, julho de 2015.
Como se pode ver na tabela abaixo, todos os meses tiveram aumentos em relação aos meses do ano anterior. De agosto até janeiro, apenas dezembro aparece com crescimento de taxa abaixo dos 100%: nesse mês, o crescimento foi de 70%.
 
       
        Os aumentos foram: agosto, 136%; setembro, 290%; outubro, 247%; novembro, 467% (o maior pico); dezembro, 70%, e janeiro, com 169%.
        No acumulado desses meses, a derrubada de floresta atingiu 1660 quilômetros quadrados, contra 531 km² detectados no mesmo período anterior (agosto-dezembro/2013), uma subida de 213%.
 
Desmate por estado
        
        Em janeiro, 75% do desmatamento ocorrido no período se concentrou no Mato Grosso (com 217 km²), seguido do Pará, com 20% (ou 59 km²). Rondônia (2%), Amazonas (1%), Tocantins (1%) e Roraima (1%) juntos respondem por apenas 5% do desmatado no período.
 
 

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Dona Luci



A pobreza não é sintoma de carência. Conheci Dona Luci, no bairro do CAIC em 1994, morava bem em frente do GEU – Grupo Espírita União, numa casa de taipa muito carcomida pelo tempo, onde o barro já se desfazia e a madeira que o segurava mostrava-se completamente deteriorada. Na cobertura de palha velha viam-se alguns buracos por onde as águas da chuva faziam fila. No Centro Espírita, fazíamos um sopão para a comunidade onde mais de 100 pessoas pegavam sopa em panelas para tomar em casa. Dona Luci, vez por outra, ficava na janela vendo o movimento, observava calmamente, como que monitorando se tudo estava bem, mostrava-se satisfeita com o trabalho. Era uma mulher bem magra, com seus 60 anos no máximo, mas que pareciam 75, bem pequenininha, no máximo 1,50 de altura, desdentada, pele branca, mas ressecada pelo sol constante e muito enrugada. Havia algo em seu rosto que transbordava, que o fazia vencer a erosão infatigável do tempo, eram seus olhos, brilhavam quando viam o movimento das crianças que brincavam no terreno em frente e as pessoas que passavam com suas panelas recheadas de sopa quente, não perdia nenhum detalhe, iluminavam-se, aliviando os sofrimentos que imprimiam sulcos marcantes em seu rosto pequeno.

Todos aqueles pequenos que corriam celeremente à sua frente, eram na verdade, filhos de suas mãos caprichosas de parteira do bairro. Pegou quase todas, as outras, amava da mesma forma, como se as tivesse pegado com o coração.

            Certo dia, enfrentamos dificuldades para confeccionar a sopa, ficamos presos no centro da cidade coletando material e ficou tarde, estávamos muito preocupados, pois naquela época as famílias contavam demais com a sopa de sábado. Chegamos tarde só para nos desculpar com a comunidade e ficamos até assustados quando ao chegar no bairro vimos a fila costumeira de crianças com panelas de sopa nas ruas. O que teria acontecido? Soubemos imediatamente, Dona Luci tirou parte do seu dinheirinho de parteira e comprou todos os ingredientes da sopa. Fomos lá pagá-la, mas ela não quis conversa,

            - De jeito nenhum, comprei com todo prazer e farei outras vezes se precisar!

            Sabíamos de suas necessidades e insistimos, mas não teve jeito, ela era decidida, uma amorosa matriarca escondida na periferia da cidade, só reconhecida pelo povo da baixada do CAIC onde sua dedicação era de grande suavidade e protegia aquele povo como se fosse sua própria família.

            Fico pensando, o que move uma pessoa quase miserável a destituir-se de seu próprio sustento em prol dos outros? Tive o privilégio de conhecer um exemplo do “Óbolo da viúva” ao vivo.

            Dona Luci era casada com Seu Vicente, um velhinho magrinho e muito calmo, teve vários filhos e muitos netos. Estão por lá pelo bairro do CAIC e lembram sempre o exemplo da velhinha do bem, são conhecidos como “Os Pilical”.

            A imagem que me marcou foi a da janela, a velhinha simpática olhando com olhos brilhantes e bondosos as crianças brincando. Ela veio a falecer, esgotada pelo sofrimento, em 1995, mas marcou sua história com amor inigualável, onde o sentimento flui de forma tão vigorosa que a dor mais parece amor.