quarta-feira, 2 de maio de 2012

Religião e religiosidade


Tem uma historinha que acho de uma singeleza e de uma profundidade tão grande, que sua simplicidade até passa despercebida.
Um velho pedreiro de nome Zé, ao sair do trabalho, totalmente esgotado por uma jornada daquelas de arrebentar, caminhava tristemente na direção de sua velha casa de palha. Muito pobre, o Zé, um homem de seus 45 anos que mais pareciam 60, passava sempre pela igreja, entrava silenciosamente, sentava em um banco qualquer e com um respeito emocionante olhava o crucifixo e dizia simplesmente:
- Jesus, eu sou o Zé e vim aqui te ver!
Ficava ali sentado, descansando e ao mesmo tempo pensando na vida. Saía dali feliz e com a certeza de que tinha se comunicado com o Mestre. Não sabia orar de forma tão bonita como tantas pessoas que frequentavam a missa e escolhia aquele momento, por se sentir envergonhado, pois analfabeto que era só sabia dizer aquela frase para falar com Jesus. Sentia-se assim, pequeno, mas dizia aquelas palavras com tanta força, com tanta compenetração, que saia da igreja como se nem tivesse trabalhado tanto. Dormia feliz.
Um dia o Zé adoeceu e foi parar no hospital, e como não tinha ninguém, ficava ali deitado esperando alguém que viesse lhe visitar, mas nada, não aparecia ninguém. Muito triste com sua solidão parecia definhar a cada dia, mas nunca lhe faltava esperança, era um homem bom e aguardava que algo acontecesse, não queria acabar seus dias no mundo, sozinho.
Certo dia quando acordou, sentiu que alguém sentava em uma cadeira que ele sempre deixava vazia ao lado da cama, estava virado para o outro lado e a expectativa era tão grande com aquela visita que não ousava se mexer, quem seria? Ficou ali, aguardando os acontecimentos. De repente, uma voz suave, ao mesmo tempo doce, terna e firme, se pronunciou:
 - Zé?
Fez-se silêncio, passaram-se alguns segundos e novamente,
- Zé?
O coração detonou em batidas fortes que mais pareciam batuque de terreiro. Então foi quando o visitante terminou a frase:
- Zé, eu sou Jesus e vim aqui te ver!
Não sei o que aconteceu com o Zé, sei que esse homem é um ser feliz e é a expressão do que se chama religiosidade. É notável como uma frase tão simplória pode conter tanta profundidade fazendo a alma transbordar em emoções indescritíveis. Deus está ali, não há necessidade de templos, de dogmas, de sacerdotes, de rituais, de belezas materiais, tudo está contido na manifestação nobre daquele homem simples do mundo. O amor, a humildade, a paz, a sabedoria profunda, faz com que ele possa pousar todos os dias sua cabeça sobre o travesseiro e dormir com a consciência tranquila.
Que importância tem que ele seja católico, evangélico, umbandista, espírita, islâmico ou budista?
Há mais amor em muitos ateus, do que em certos religiosos que aclamam Deus como se fosse propaganda de remédios.
Há mais espiritualidade no religioso que não cumpre as regras da igreja e que raramente vai ao templo, mas que participa voluntariamente de programas junto a comunidades em situação de risco social, que perdoa e que é indulgente com as imperfeições alheias.
E a religião? O que é mesmo? Peço que tire suas conclusões.
Pense no Zé!

Caboco Nirso